terça-feira, 7 de outubro de 2008

O Incrível Sex Appeal das Paredes


Cenário: uma boate chamada Crepúsculo de Cubatão, toda preta, no posto 6 de Copacabana, exatamente no point mais quente da cidade no meio dos anos 80.

Uma Cynthia de meias arrastão rasgadas, brinquinho de rã pendurado na orelha, dança ao som de um grupo irlandês ainda desconhecido o U2 e Titãs em começo de carreira.

O Crepúsculo era massa e mesmo uma mulher com peitos como eu adorava fazer de conta uma androginia cem por cento inexistente. A boa era ser andrógino então éramos todos andróginos. Andávamos de preto, cortávamos os cabelos espetados e fomos provavelmente os inspiradores dos darks.

Havia esse costume: a gente ia dançar, mas ninguém dançava com ninguém. Todos dançavam com as paredes. Tive um verdadeiro caso de amor com a parede do canto esquerdo do Crepúsculo. Já sabia de cor todos os buraquinhos que ela tinha.

De tanto dançar com ela, a Dona Parede, um dia ela me lançou uma cantada. Uma cantada descarada, pior do que todas as cantadas que já levei ou dei. Ela sussurrou no meu ouvido “você é um mulherão, larga desses baitolinhas dos seus amiguinhos e chega mais, vem aqui, esfrega esse teu pernão e rasga de vez essa meia arrastão. Vem ser a Madonna da minha existência no filme que ela só fará no futuro, na cama com.”

Fiquei sem fôlego. A parede estava requebrando toda nua para mim. Reta como uma parede, ostentava suas exatidões de uma forma inegavelmente lasciva. A parede me cercava, pela frente e por trás, eu não tinha como escapar aquele abraço frio e cheirando a tinta e gesso.

A parede safada pegou no meu peito, sim, aquilo tinha sido uma pegada tipicamente paredal. Só tinha bebido cerveja, não tinha fumado, portanto, era inexplicável aquela estranha conformação retilínea levantando minha saia de couro preta.

Qual o sexo da parede? Desconfiei que era feminino porque ela era cheia de buracos. Mas como era dura feito um cara de tudo duro, poderia também ser um homem. A parede era sexual, basta dizer isso. E quando vi, estava sendo apalpada no lustre.

Gozei vendo o mundo de cabeça pra baixo. Desde então peguei o hábito de abraçar paredes e das paredes passei pras árvores e das árvores para o universo inteiro, animal, vegetal e mineral. Só quem me entende mesmo é Schoppenhauer que fala da vontade das coisas. Não contem pro meu namorado, mas ontem mesmo eu vi: a poltrona do cinema bem que deu uma encoxadinha em mim.

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