domingo, 5 de novembro de 2017

A Borboleta Azul, a Tartaruga e o Sanhaço

A Borboleta Azul, a Tartaruga e o Sanhaço

Tem umas histórias que conto umas mil vezes porque adoro lembrar delas.

A primeira se passou quando eu era criança. Estava no Parque da Cidade. Já tinha dúvidas existenciais nos meus sete gorduchos anos. Me perguntava sobre a existência de Deus e principalmente sobre a minha. Estava muito impressionada com a foto da menina nua vietnamita correndo. Pensava que não era possível existir Deus se aquilo acontecia com uma menina que devia ter a minha idade. Aí eu vi uma borboleta azul. Saí correndo atrás dela. Nada de pegar. Aí sentei e pensei: se Deus achar que eu tenho uma missão no mundo a borboleta virá sozinha pousar na minha mão. E fiquei lá bem paradinha. Depois de um tempo a borboleta azul veio por si só e pousou de fato na minha mão. Desde então eu sei que tenho uma missão importante.

A segunda história que gosto de contar era uma em que eu tinha acabado de correr no Aterro e vi ao longe um homem na beira do mar com alguma coisa redonda e grande. Fui até a areia, tirei o tênis e era um cara com uma imensa tartaruga marinha. Ele era um pescador e a tartaruga havia ficado à noite toda presa na rede se debatendo. Estava muito cansada e se ele não ficasse ali com ela a bichinha afundaria e morreria. Aí ele estava muito nervoso porque temia que algum fiscal do IBAMA o visse e o multasse por pesca ilegal a uma espécie em extinção. Então me ofereci pra ficar com ela. Ele me ensinou o que eu deveria fazer e eu fiz. Retirava a cabeça dela pra fora da água e a deixava respirar.
Não sei por quanto tempo fiz isso. As crianças vieram brincar conosco muito impressionadas. Todas queriam ajudar a mim e a tartaruga. Tiramos ela da água, deixamos na areia tomando sol, pusemos de volta. Ficamos ali na função respiração de tartaruga um tempão. Até que finalmente ela começou a mexer as patas com mais força. Quando vi que ela estava mesmo bem forte soltei. E ela nadou lindamente pro fundo. Eu e as crianças ficamos felicíssimas e imaginamos tudo o que a tartaruga faria agora que estava livre. Que teria filhotes. Que um dia nadaria conosco. Acho que já nadei com ela em Fernando de Noronha. E ela tinha filhotes.

A outra história era do meu ar condicionado do meu antigo apartamento na General Glicerio.
Um belo dia começou a rolar um alvoroço de passarinho. Uns fiapos. Uns trecos. Sons de asas. Um tempo depois, piados. Meu ar condicionado era um ninho de uns passarinhos meio verdes que depois descobri serem sanhaços perguntando pros ornitólogos de plantão. Haviam alguns filhotes. Eram 3 criaturas. Olhei pelo buraquinho. Eles piavam muito. Não me deixavam dormir às vezes. Aí peguei o hábito de falar com eles. Não é que eles prestavam atenção em mim? Acalmavam. Aí finalmente apareciam os pais (onde estavam? Na balada? Por que não vinham dar comida pros carinhas? Falta de inseto? Falta do que?) e eles comiam e dormiam todos.

Isto durava semanas. Aí um dia o ar ficava silencioso e eu sentia falta dos meus bichos fazendo algazarra. Não por muito tempo. Fizeram 3 vezes ninho no meu ar. Era um caos. Eu curtia.
Quando mudei pro Flamengo fiquei muito preocupada com meus parentes sanhaços. Aonde fariam seus ninhos da próxima vez?
Até hoje olho os sanhaços e me pergunto se vem lá das Laranjeiras. Mando lembranças.

Bordadinhos da Vida

Bordo e as violetas florescem
O gato vem brincar
Com os novelos de lã
E eu faço nó nos meus pensamentos
Uma fada boa de mãos dadas com uma ruim
Ambas rindo de mim
Dedos furados na agulha
Versão contemporânea dos velhos contos
Em vez de dormir
Vou ao cinema
No lugar do príncipe
Aguardo ansiosa a nova geladeira
A antiga pifou e só serve pro gato brincar de esconder

quarta-feira, 14 de junho de 2017

a gelatina e o docinho italiano

não tem como uma gelatina diet vencer uma paglia italiana. Não tem. Pra gelatina vencer você tem de pensar que se comer a paglia irá ter diabetes, sua perna vai ser amputada, você vai ter Alzheimer e as sete pragas do sedentarismo irão todas te atacar cruelmente. Se você consegue naturalmente ser magra e linda, só comer frutinhas, legumezinhos e ser feliz, deve ser porque não gosta tanto assim de paglia italiana ou porque viu o vídeo que compartilhei hoje sobre as pobres vacas estupradas e decidiu racional e sabiamente nunca mais se aproximar de nenhum derivado de leite para parar o estupro dos pobres animais indefesos. Parabéns pra ti, mas eu ainda não cheguei neste grau de maturidade.
Vejam a lógica macabra da coisa toda: alguém inventou o leite condensado. Inventou o leite condensado no tempo que as vacas davam leite e não eram inseminadas artificialmente e com violência, no tempo que elas eram manualmente ordenhadas, tudo ali lindo como a Noviça Rebelde, o filme. Aí veio outro e inventou que com chocolate a coisa ficava mega interessante e botou ainda por cima biscoito maisena no tempo em que as coisas todas eram melhores e mais saudáveis. Aí nasceu a paglia italiana, que talvez nem seja italiana e sim uma palha soteropolitana da boa. Um treco mega plus ultra docíssimo que faz suas taxas de açúcar irem todas para as alturas.

Aí as pessoas comem estas porcarias durante toda a sua juventude. Quando ficam mais velhas, engordam, adoecem e são obrigadas pelos médicos a largarem disso tudo se não quiserem morrer no fogo dos infernos das doenças advindas desta civilização que é toda ela, de cabo a rabo, hipócrita em um tudo. Inclusive sobre este papo de doenças e velhice. Porque o cara não adquirir diabete não significa que ele não vai adquirir alguma coisa e morrer no fim das contas do mesmíssimo jeito que o que adquiriu diabetes. Todas as doenças são horríveis e algumas são mais feias mas todas são mais ou menos letais.

Mas vou voltar pra estrada. O cara come estas porcarias maravilhosas toda a vida e depois adoece. Uns por muita pizza, outros por muito açúcar, outros por muitos cigarros, outros por muito álcool. Ora, se estas coisas adoecem, por que caralhos são tão facilmente encontráveis em toda esquina?
Vão me chamar de louca, mas ao meu ver a paglia com g italiana ou baiana sem g é uma droga tão ou mais perigosa que a cocaína. E é dada para as criancinhas. As verdadeiras portas para outras drogas são os brigadeiros, cachorros quentes e coca-cola dadas nas festinhas de criança para as pobres e inocentes criancinhas que se viciarão nisso e depois adoecerão disso. Quem desconfiará do próprio pai ou mãe como sendo um vilão?

Tenho uma lista destas coisas que parecem bestas mas são fatais.

Quer ver outra? Rasteirinha.

O que toda mulher (e alguns homens) irão descobrir lá pelos seus 45, 50 anos é que as sandálias rasteirinhas como são chamadas aquelas sandálias que são sem salto e sem uma borrachinha pra amortecer a pisada no solo fazem um senhor mal aos pés e acabam por dar um monte de doenças nos pobres pés. E aí a pessoa só lá, quando já está lascada descobre é que o pé não fica isolado do resto do corpo. Adoecer do pé e logo depois do joelho ou do tornozelo é bem mais comum do que parece. Há centenas de milhões de casos. Porque o corpo não é um bando de partes separadas umas das outras e sim um corpo só. O pé fica no mesmo corpo que o braço ou o pescoço. Um pé doente, uma pisada errada afeta todo o demais organismo. Isto se descobre geralmente quando já se adoeceu de um tudo.

Por que continuam fabricando sapatos sem uma borracha que amorteça a pisada se todos os ortopedistas sabem que não se deve usar este tipo de pisante?

A moda deveria incorporar, natural e obrigatoriamente, todos estes conceitos que são conhecidos por todos os profissionais que lidam com o corpo. Quem quisesse uma rasteirinha que fabricasse a sua e ficasse ferrado depois por sua própria conta e risco. Mas não avisar as jovens que elas irão forçosamente acabar ferradas se usarem estas porcarias e ainda por cima ditar uma moda obedecida depois por todas as lojas é uma baita falta de sacanagem com as pessoas, particularmente com as mulheres. Neste ponto acho que as mulheres são sempre mais vitimadas pela moda que os homens. São sapatos de bico fino, sapatos de saltos agulhas de sei lá quantos centímetros, roupas apertadas e os cabelos....deuses, os cabelos merecem parágrafo especial.

Aquela operação assassina chamada "escova" que alisa os cabelos da moçada: aquilo foi inventado por uma pessoa que odeia mulheres. Tenho absoluta convicção e não preciso de provas. Puxa cabelo, queima couro cabeludo, quanto mais puxa "mais lindo fica". Horror dos horrores este negócio que este bando de mulher se submete. Pra que? Pra ficar na moda dos cabelos com escova. Porque hoje é considerado elegante ter o cabelo assim repuxado e é considerado "largação" deixar o cabelo como Deus fez.

Se eu fosse homem e minha namorada aparecesse na minha frente com o cabelo "escovado" eu diria pra ela como Zeca Baleiro: Baby você não precisa de um salão de beleza. Porque homens que amam mulheres deveriam é se revoltar contra os maus tratos que suas amadas recebem e ainda pagam caro por isso. Tem que ser muito misógino pra aprovar uma escova.
Poderia seguir com esta lista, mas prefiro que vocês leiam um bom livro nesta noite. Boa Noite. Bom Dia. Boa Tarde- Cynthia Dorneles sentindo-se revoltada

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

mães que amam demais de menos de trás e de frente

mães são animais indóceis que ou criticam demais ou amam demais ou fazem sei lá o quê de menos. Não tem muita saída: Freud já mandou a letra sobre o triângulo edipiano formador das primeiras neuroses de nossos filhos, Lacan endossou esta visão dos infernos com aquele papo de mãe jacaré que come seus filhotes e o único que foi bonzinho com as mães foi Winnicott que realisticamente reconheceu que basta que a mãe seja suficientemente boa. Suficientemente boa é sensacional. Bem mais próximo de nosso feeling de mães.


Se você é mãe e desconfia que fez alguma coisa errada com seu filho há uma forte chance de ter mesmo feito algo de errado. Provavelmente mais de uma coisa. Só me pergunto quem será esta mãe que nunca erra. Pelo amor de Deus não me contem. Prefiro ter a ilusão de estar acompanhada por um monte de amiguinhas. Já pensou se amanhã de manhã acordo com um monte de postagens de filhos e filhas agradecidos por suas mães perfeitas que jamais pisaram na bola com eles? Pulo da ponte. Melhor não.

O fato foi que ontem o filho fala en passant, assim, muito brincando, de boas, sem nem achar que eu ia ouvir ou levar a sério, que eu só o criticava. Aí hoje passei o dia tentando compensar tal ato malvado de minha parte de só o criticar. Quem sou eu pra criticar quem quer que seja? Por acaso sou Juiz Moro na vida? Tô com a Lava Jato no corpo? Sai deste corpo que não te pertence credo em cruz. Fora Temer. Acredito mais que como boa neurótica que sou, a culpa passa lá no Japão e eu aqui no Rio já a tomo pra mim. Então o filho fala brincando mas eu levo tremendamente a sério. Aí até cozinhar no verão cozinhei. Aqui na minha mini tribo cozinhar com altas temperaturas é considerado pecado mortal. No verão não é uma época pra uma mulher emancipada, militante feminista como eu, se aproximar de um fogão quente existindo tantos deliveries. Mas lá fui eu pro fogão as dez da noite. Tudo pra compensar ao filho estas tantas críticas e demonstrar assim o meu apreço à criatura.

Aí entrego assim, minha primeira tapioca com carne assada, queijo canastra derretido, batatas coradas. Pergunto se gostou. "Não deu pra saber, tá muito quente, ainda não provei" responde o cabra. Olhos atentos, o vejo dando a primeira garfada. Aí digo: calma, vai se queimar, tá muito quente. E então arrisco novamente: prestou?
Tá uma delícia. Ufa. Aí lá vou eu: filho, te acho um cara incrível, boa gente, solidário, lindo de morrer, você acha que só te critico? Você percebe que mamãe te ama?

Aí o que ele responde? "até demais".

Aí sim, assim tá bom. A ideia é esta mesma. Que eu peque por amor demais. Claro que dá zebra amar demais. Mas fico mais feliz em ser uma mãe que ama demais do que uma que critica demais. Assim tá bom, assim tá justo, tá bacana, tá favorável. Porque errado eu sei mesmo que faço um monte de coisas.

Se ele ler isto, vai ficar sem jeito, claro. Todos eles ficam. Envergonhadíssimos. Bem, é isso, rapazes e moças. Mães são insuportáveis. Irremediáveis. A gente nunca se recupera de ver vocês quando bem pequenininhos mamando de nosso leite, dormindo tranquilos, no nosso colo. Seja lá o que role depois, mesmo que nos tornemos até distantes- sim, as vezes podemos nos distanciar, a vida é assim- sempre que olharmos para vocês viveremos uma idílica memória de vocês serem nossos filhos amados, orgulhosas por vocês terem dado seus primeiros passos, por terem aprendido a falar, depois a nadar, depois a contar, depois a ler e todas estas coisas que são esta grande aventura de formar uma nova pessoa no mundo.

Quando vocês estiverem ali, muito compenetrados sendo adultos, nós lembraremos de algum dia em que tivemos de trocar suas fraldas num bar lotado num ato impossível de tornar limpinho um bebê num lugar nada higiênico ou algum ato do gênero.

Tenho dito. Assinado mamãe Cynthia Dorneles