segunda-feira, 29 de junho de 2009

Pássaros


Um pássaro desesperado na gaiola é idêntico ao coração quando diante de uma dor insuportável. Estar tão angustiado que respirar o ar seria igual a respirar água nos afoga- faz parte das metáforas que ajudam que um comunique ao outro aquilo que sente. Mas as palavras não passam nem perto do sufoco, apenas acariciam a superfície sólida e enigmática da dor.

Simplesmente não se explica. O desejo, a dor, a beleza, o milagre, a poesia. Na ponta da asa, o vôo é cego e o mergulho é um salto na imensidão.

Os que entendem, sorriem o pequeno sorriso, tão sério e tão rasgado da compreensão. Os que não entendem a maioria talvez possam falar - ou silenciar- que diferença faz? Não muda o fato de que a maioria não ousa, não arrisca, mal respira para que jamais seja confrontada com a incrível dor de viver.

Seja como for, felizmente faço parte do grupo de pessoas que não precisa de uma cama de pregos para lembrar que o corpo existe e que ele tem limites difíceis de transpor. Que todo limite que existe é feito para ser conhecido e que cada célula do nosso ser clama pelo impossível: estar tão viva que a morte não seja nada além do fim.

O fim não espera, o fim acontece. E acontece de tal forma que nunca sabemos que ele finalmente foi. Foi o quê? Foi quando? Jamais sabemos. Os outros sim, eles saberão. Mas nós? Só poderemos suspeitar. A morte é nossa vizinha suspeita, de quem controlamos os passos, mas ela sempre está onde não imaginamos. Nisso, de estar onde não se imagina a morte não é muito diferente da vida. Amigas inseparáveis as duas. Uma só existe, porque existe a outra.

domingo, 21 de junho de 2009

Dieta de Solidão


1 chocolate quente, 1 pastel de damasco com ricota, 1 torta diet de cheesecake de amora, 6 amanditas, 1 bombom de avelã, 1 bombom de café, horas e horas de conversas onde todo mundo finge ser inteligente, 5 telefonemas para ausentes e um filme da mostra do panorama francês.

No panorama do cinema francês a solidão tupiniquim não aparece porque a solidão francesa não tem bom humor. A nossa tem. Até nosso desespero tem graça.

Na tela muitos olhos azuis. Nas capas de revista também. Hitler ganhou a guerra, basta ver o salário das top models louras, legitimamente arianas.
Invente a sua.

domingo, 7 de junho de 2009

Caia 7 vezes, levante 8


Tem coisas que não acabam, param. Esta frase da peça vale a peça inteira. Porque há histórias que não terminam, porém subitamente desertam. Porque a vida estanca, a vida pára, sem aviso, sem uma única dor que dê o sinal. E resta a nós assistirmos o desenrolar da vida, como se nada tivesse acontecido. Desertar: o verbo mais exato para o deserto que resta quando certo alguém se vai.

Pequenas coisas. Asas de um pernilongo. O rio que leva tudo para o mar, não leva nossas lembranças. A cidade cresce, sai do chão e os possantes automóveis passam sempre raspando pelo desatento pedestre. Se pé desse, o pedestre voava. E ele voa de vez em quando, enquanto zunem seus ouvidos com a freada brusca.

Caia sete vezes, levante oito. Assim disse um peregrino urbano, um desses quinhentos mil seres que habitam os mais diversos pontos do globo. Abandona tudo e vai, porque sabe que ir é o destino do ser e repetir a sua derrota.

A gente diz sim, como quem oferece um diamante. O outro recebe e vê uma chupeta. O outro debocha. Raramente vê no diamante o brilho, que é o que realmente interessa da dureza cintilante do minério. A gente se faz palavra porque nos construímos pontes. Queremos tocar o intocável, ver o invisível, lembrar do imemorável, conviver com o impossível. Plantar sementes e colher estrelas. Assim somos nós, aqueles que cantamos os abismos.

Com uma pequena ajuda sua, eis que vôo e me torno a estrela em rota de colisão pela qual tanto esperavas. Sem você, por aqui fico, por aqui escondo as sementes de estrelas bem no fundo do meu poço sem fundo, meus olhos escuros, meus dotes escusos. Silêncio. E música. Vago cheiro de gerânios e jasmins. A terra e a doçura do dia. A quietude da noite. O caleidoscópio de mil pequenas vidas.

A menina com diamantes olha para você pelo buraco da fechadura. A bossa nova que canta os Beatles, Rita Lee. Nossa vida sempre cabe numa canção, ou em algumas. Mas o filme é sempre um só. Cada um tem o seu, único, insubstituível.

Meu olho foca a toca da foca. Coisa sem sentido, por certo. Mas o que é fazer sentido quando tudo é simples caos e dança?

Dou meu coração. E corôo um ato falho. Confio em você.