domingo, 24 de agosto de 2014

A Natureza e Eu

Max Jacob respondendo a um convite para passar o fim de semana no campo, entre estupefato e apavorado:"O campo? Este lugar onde os frangos passeiam crus?".

Esta é uma citação de Julio Cortázar em Um Tal de Lucas, no capítulo que se chama Lula, Suas Meditações Ecológicas. Cortázar diz que uma paisagem, um passeio no bosque, um mergulho na cachoeira, um caminho entre as pedras só podem nos preencher esteticamente se temos a garantia de regresso à casa ou ao hotel, ao banho lustral, o jantar e o vinho, a conversa à mesa, o livro ou os papéis, o erotismo que tudo resume e recomeça. Ele diz duvidar dos admiradores da natureza que de vez em quando descem do carro para admirar o panorama, dar meia dúzia de pulos entre os penhascos, ou "esses escoteiros vitalícios que costumam deambular sob enormes mochilas e barbas desaforadas" cujas reações são monossilábicas ou exclamativas, onde tudo parece consistir em ficar repetidas vezes estupidificado diante de um morro ou de um pôr do sol que são as coisas mais repetidas que se pode imaginar.

Ele chama nossa época de um "retorno despenteado e turístico à Natureza, em que os cidadãos veem a vida do campo como Rousseau via o bom selvagem". Ele fala que os civilizados mentem quando caem no devaneio bucólico porque se faltar "o scotch on the rocks às sete e meia da tarde" estes irão amaldiçoar o momento em que deixaram suas casas para vir padecer mutucas, insolações e espinhos.

Achei isto tudo muito engraçado. Sou meio que nem Cortázar e Max Jacobs embora não tenha problema com os frangos correndo crus e de me faltar scotch on the rocks. Mas se eu ficar sem um livro bom, sem internet, sem uma loja de belos artesanatos, sem meus banhos e principalmente sem minha máquina fotográfica irei ser soterrada sob o tédio profundo.

Quando estava grávida, meu companheiro me levou por uma linda trilha em Arraial do Cabo para me mostrar o que ele chama de O Templo. Lá fui eu, meio titubeante, não gosto de ficar pulando pedras em despenhadeiros, mas sabe como é, o amor e tal, eu já tinha comido sushi para fingir que era adulta (eu gosto de pudim, chocolate, sorvete, batata frita, picadinho não de peixe cru) por que não iria ao tal do Templo? Fui.

Cheguei lá, olhei um pouquinho, depois disse "vamos embora? Não tá acontecendo nada". Meu companheiro me olhou chocado. "Como assim, nada? Veja este lugar, veja o pôr do sol". Eu olhei. Realmente, divino. Mais cinco segundos. "Podemos ir? Aqui tem formiga".

Sou legítima herdeira de minha avó. Minha avó tinha pesadelos com vacas bravas perseguindo-a no campo. Ela havia morado numa fazenda a vida toda e gostava era de visitar cidades, não estes lugares bucólicos que já a haviam enchido toda a infância e a adolescência.

Quando visito florestas, tenho pânico de cobras e não consigo dormir com os mosquitos. Acho lindo. Pago uma fortuna para ir a estes lugares. Mas confesso que jamais viveria lá. É para fazer fotografia e turismo. Viver eu gosto mesmo é de viver no meu Rio de Janeiro bem poluído, bem cheio de gente, muita confusão e muitas salas de cinema, ah, sim, muitas salas de cinema alternativo inclusive. Adoro ver paisagens de lugares exóticos. Ver no filme é mais barato e não tem mosquito nem cobra

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