quinta-feira, 13 de março de 2014

Um Brinde à Vida

Ontem no metrô lotado me dei conta que passei mais de quinze anos sem tomar metrô- porque tinha síndrome do pânico- ou, pra quem não gosta destes nomes inventados, tinha um medo maior que o mundo.


Meu primeiro ataque foi dentro de um metrô lotado, então toda vez que entrava dentro de um, mesmo que vazio, eu passava mal. Depois do primeiro ataque vieram outros. Tive ataque de pânico depois de correr no Aterro- aí passei também uns quinze anos sem fazer exercício físico aeróbico. Tive ataque de pânico dentro do banco, aí não conseguia mais entrar em banco. Depois em super mercado. Cada situação onde tive ataques de pânico, eu simplesmente me travava e não conseguia mais fazer aquilo sem ficar muito ansiosa.


A lista de coisas que me davam pânico e ansiedade era imensa. Precisei fazer muita terapia- fiz terapia lacaniana, bioenergética, biodinâmica, reich- fui em muito pai de santo, igreja, e tudo o que prometesse ou desse alívio de fato.


Tive melhoras e recaídas. Até chegar neste ponto onde estou hoje em que nem parece que passei tantos e tantos anos sem fazer tantas e tantas coisas.


Curiosamente, em vez de olhar para tudo o que já alcancei, todos os sucessos que tive no meu próprio tratamento, fico olhando pras coisas que não consigo fazer.


Como hoje em dia cuido de muitas pessoas, sei que é assim mesmo. A gente tende a olhar não para onde estamos dando certo, onde alcançamos nossos objetivos mas para onde estamos mal, onde não conseguimos, onde falta.


Aí neste ponto fecho com a psicanálise: somos os seres da falta. Sempre achamos que o outro tem algo que não temos e sempre tendemos a achar que não estamos bem nisso ou naquilo.


Também aprendi que cada terapia tem o seu valor porque com cada uma delas aprendemos alguma coisa que nos ajuda a ir adiante e quem sabe, vencer nossos obstáculos.


Aprendi a não ter preconceito contra remédios, psiquiatras. Tem vezes que só o que resolve é um ansiolítico ou um antidepressivo. Precisamos de médicos com suficiente bom senso para perceber que às vezes temos de tomar remédios e outras temos de parar os remédios. E os médicos também erram.


Um dia anunciei para o meu psiquiatra que ia parar de tomar o antidepressivo. Ele, muito grave e solene, com toda a pompa do seu saber científico, anunciou que 9 entre 10 pacientes que param de tomar antidepressivos voltam a ter ataques de pânico.


Adoro meu psiquiatra, mas jamais tomarei remédios sem precisar tomá-los. Parei. Nunca mais precisei, há muitos e muitos anos. Se um dia precisar, vou no mesmo psiquiatra e peço penico. Continuo tendo por este profissional o mesmo respeito de antes, não foi por conta de um discurso tão quadrado que deixei de respeitá-lo. Simplesmente mesmo grandes profissionais erram.


Fato é que hoje entro em metrô, banco, super mercado, vou em bloco com mais de milhão de pessoas, vou em manifestação, corro da polícia, corro de ladrão e descubro, bastante surpresa, que hoje só tenho medo. Pânico? Nunca mais.


Me permito contar esta vitória. Sim, às vezes, na luta contra as neuras, nós vencemos. Ninguém precisa se conformar a sofrer com suas neuroses. Um brinde à vida e ao amor, pois de verdade, por baixo de cada terapia e remédio que deu certo, havia amor. O amor tem mil possibilidades. E ele pode mais que a morte e a doença.

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