domingo, 28 de setembro de 2008

Homenagem a Clarice Lispector


O espaço aberto de uma grande sala e seu silêncio convidam para dança e para música. Se dançar sou a música, se canto danço as notas numa pauta musical.

A mãe lê para sua filha pequena Clarice Lispector. Se o analisa de Clarice lá pelas tantas não conseguiu acompanhá-la, por que uma criança o faria? A sisuda menina já é totalmente misteriosa e secreta como o espectro de Lispector.

A escuridão da sala é própria para a entrevista da escritora e perfeita para dois homens enamorados, finalmente livres para o abraço e o beijo.

Escrevemos porque queremos testemunhas dos enormes mistérios que casualmente encaramos como se nada e como se nós, fôssemos outros.

Poderia passar o dia todo entre as inúmeras gavetas da exposição. Todo dia, abriria apenas uma e me deixaria inundar pelo oceano que contém. Uma loura desenxabida me indica que tem pressa de abrir a gaveta. Para ela, nenhum oceano. A pressa de todos impede a imersão nos mares em gavetas. Falta ao público presente um pouco do peixe no aquário, prisioneiro da vida num vidro.

Tornei-me parte da exposição porque tomei de assalto um banquinho e atrapalho todos os sedentos de mais um dado de biografia da grande escritora que preferia que as letras fossem penugem de criança ou qualquer outra coisa.

Mulher de saia de bolinhas faz de conta que escreve, escrevendo uma letra após a outra até um fim de página de um caderno imaginário.

Quem precisa de imaginação havendo sempre o silêncio das bisbiliotecas e a realidade em etapas de tempo e linguagem?

A exposição do silêncio de Lispector nos convida a todos a sermos nós mesmos parte com suas letras abissais. Pois como negar que a explicação do enigma é a repetição do enigma? Por que não pensei nisso antes? Vivo tentando dar conta dos labirintos que permeiam minhas estações. Que tola fui eu até este dia? A mesma que amanhã enquanto meu ar for todo ele poesia e eu preferir sempre a declaração de amor feita por escrito, lavrada e assinada na pele, as mãos dadas em público. Ou o vento me aniquilaria com sua rota.

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