sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Menino Sírio, Menino Carioca

O poder não é uma simples ilusão simbólica como querem fazer crer alguns. Não é uma ilusão que a OTAN promoveu a Primavera Árabe para desestabilizar as ditaduras progressistas que eles próprios instalaram em torno da Síria, Líbia e outros. Não é uma ilusão que a Síria era um grande estado forte e que não curtia Israel- fato que no mínimo atrapalha os negócios.


Não, não basta a vontade e a potencia juvenis para desfazer os grandes interesses, a política e a economia mundial. Não, não dá pra reinventar a realidade todos os dias só porque eu quero, tu queres, ele quer. Não dá não. E tampouco é verdade que maio de 68 foi o lugar de ruptura do antigo mundo das utopias e o fim das teleologias.


A teleologia está muito viva quando vemos que os jornais brasileiros refletem o desejo das nossas classes médias, ansiosas por desfazer a política instalada pelo PT após 12 anos de governo- uma política muito diferente das anteriores, por mais que desejem reduzir a pó todas as ideologias, todas as possibilidades políticas de novos horizontes ligados ao trabalhador e ao trabalho. Lula nunca foi comunista, nem mesmo socialista. Lula foi um metalúrgico. Homem do povo e carismático líder político que sabia muito bem aonde estava: Brasil, país dos latifúndios, das oligarquias, onde governam até hoje velhas famílias com nome e sobrenomes bem conhecidos há séculos seculorum. Falou mal do Sarney e do PMDB sim, para alcançar o poder. No que o alcançou se aliou a ele. Simplesmente porque não dá pra mandar matar esta gente, estas velhas famílias que estão no poder há tanto tempo. Você cria alianças para poder governar. Coisa que Lula não precisou de nenhum cientista político que lhe explicasse.


Mau caratismo do Lula? Coisa nenhuma. Realismo, pragmatismo político. Política é a arte das alianças, Maquiavel já sabia. É má fé uma pessoa que já tenha lido algum texto de Maquiavel tratar do fenômeno Lula como o fazem os ignorantes deste nosso imenso país com tantos ignorantes. Lula é um cara que não precisou estudar Maquiavel pra perceber o que está na cara de qualquer um que algum dia já tenha estado no planeta Brasil. Que não é tão diferente da Síria, se pensarmos bem.



Estes países todos do mundo se assemelham. Suas práticas políticas se assemelham. Temos culturas com bases diferentes, óbvio, mas por exemplo, o Podemos não é muito diferente do nosso PSOL. Há tantas e tantas semelhanças como também há diferenças, se focarmos aqui ou ali.

Com certeza, o menino sírio não é diferente dos milhares de meninos que aqui são aliciados pelo narcotráfico e morrem ainda pequenos debaixo de tiro achado ou perdido. Somos todos humanos, macacos pelados. Sozinhos, somos frágeis. Juntos, somos ferozes predadores. E nós, mães do mundo, choramos a morte de todas as criança sobre a Terra. Tal como nos encantamos com os filhotes de gatos, cachorros, tigres, onças, todos os mamíferos.



quinta-feira, 23 de julho de 2015

Sim, eu viajo. Viajo aqui mesmo. Abro meus olhos e lá estão paisagens solares, cheias luz, dramas, lágrimas e risos. Todos os dias. Por cada instante. Tenho coisas preciosas como um dicionário de nuvens, uma bússola cujo norte é no sonho e o sul no coração. Já que não tenho asas, me faço toda olhos para cada pluma vento e pássaro. Às vezes lembro quem sou e me espanto. Serei eu aquela que faz compras ou esta que adivinha milagres?

quarta-feira, 8 de julho de 2015

talvez as latas sejam mais capazes de amar do que os homens
pensa o homem que cata as latas
em algum lugar leu que as coisas têm vontades
que há vontade nas coisas
talvez haja mais vontade nas coisas do que nos homens
por isto os homens tenham tanta preguiça
preguiça de fazer diferente
de olhar um pouco mais de ver um tanto mais
tanto mais mais mais
que as pessoas ficam menos menos menos
o homem usa chapéu
pra seus pensamentos ficarem presos na cabeça
sem chapéu tudo viraria pássaro
e sabe-se lá que coisas poderia ver de um céu tão distante
um pássaro tão esquisito
criado pra ser gente
transformado em lata
redescoberto em asas e plumas e uma montanha de ar
que todos os dias se mexe
mas ninguém dá bola
gostaria de ter uma bola
pra chutar bem longe
tudo o que não tem saída
só mais ruas
mais ruas
mais ruas
nada nada suas
precisou inventar umas palavras
para poder ficar ali sossegado
na solidão de seu primeiro pássaro imaginado
Metafosforices aparte
eis que ele era bom nisto de apenas ser
e tornar-se encontrável
na figura colorida daquele monte de metal
que era só seu
por enquanto
depois
nem isto.

segunda-feira, 6 de julho de 2015

há muito tempo no Baixo Leblon

Lá pelos meus 18 anos, uma bela madrugada eu estava lá no Baixo Leblon. De repente ouvi uns Pa Tá Tu Tá. Pensei que eram fogos de artifício. Fiquei procurando de onde vinham. Gosto de fogos, de luzes brilhantes, cores desde sempre. Foi quando reparei que todo mundo tinha se jogado no chão e uma criatura caridosa pegava no meu tornozelo e me apontava pro chão. Pra eu me jogar no chão feito todo mundo. Neste dia, morri de poesia. Neste dia, vivi de poesia. Aos poetas são permitidas muitas vidas e ver o São João no meio do tiroteio. Assim era. Assim sou. Lembro que quando estava no chão senti cheiro de limonada.

terça-feira, 16 de junho de 2015

poema do dia dois


Há uma janela fechada
há uma tábua faltando
um dente quebrou
o preço do dentista
a tinta descascou
a criança cresceu
a vida fica no passado
as faltas no gerúndio
é preciso ser índio
urgente
antes que se feche a taba
antes que se mate a tapas
toda a alegria
e só sobre a alergia
no baralho das letras
todo amor vai à Roma
e tudo é fruta romã
pra que poesia quando se tem a fotografia?
eis porque se parou de ler
eis porque as bibliotecas estão encerradas na poeira
na neblina dos dias
e as fotografias cada vez mais vazias
quem se lembra quantas viu ontem?
é preciso imaginar gastar tempo perseguindo sentidos
perder-se nas esquinas sem mapa algum
salvo o coração nas mãos
ou nada feito
agora nade e só páre quando se souber náufrago
é nesta hora que as gotas de chuva se tornam deliciosas

segunda-feira, 15 de junho de 2015

Poema do Dia Um


os olhos para ver
o nariz para respirar
os ouvidos para escutar
suficiente para participar desta festa
que acontece todos os dias

surgem nuvens
vem a chuva
abrem-se os botões da flor
as abelhas em volta
as gotas coloridas
no vidro a menina lambe pensando ser bala
vão-se as nuvens
voltam as nuvens
a festa é sempre
se você nunca lá está
não é por falta de convite

quarta-feira, 13 de maio de 2015

na mais perfeita desordem

poesia é fácil
pense num cachorro
pense no nariz do cachorro
pense em como é frio e molhadinho
agora sinta o calor do corpo do cachorro
sentiu?
Você consegue fazer poesia da mesma forma
que o cão voa para pegar seu osso
voar é coisa de poeta de cão e de passarinho
não necessariamente nesta ordem
aliás
na mais perfeita desordem