O Sal da Terra é um filme belíssimo sobre o trabalho e a vida do Sebastião Salgado. Wim Wenders tenta devolver ao homem que dedicou sua vida a retratar as pessoas e o mundo, um retrato de si. E como reconhece o próprio Wim Wenders, é muito difícil se fotografar a um fotógrafo, que se bobear faz uma foto de quem o fotografa melhor do que o que é registrado.
Sebastião Salgado é um homem de esquerda, que passou literalmente toda a sua vida a fazer registros- impressionantes- dos desvalidos da terra. Deixou sua família, seus amigos, deixou a todos para estar nos lugares onde com tanto carinho fotografou os mais invisíveis e abandonados da Terra.
De repente gente de direita está curtindo o trabalho do cara. Por que? Porque após seu penúltimo trabalho, Êxodos, onde Sebastião foi fotografar as imensas populações que estavam sendo obrigadas a migrar por razões políticas em sua maioria e testemunhar a mortandade provocada por governos assassinos que não permitiam que a comida chegasse aos que precisavam comer-Sebastião adoeceu. E este adoecimento coincide com a morte do pai e o legado de sua fazenda, já completamente estéril. Aí Sebastião, numa espécie de rendição e tentativa de dar sentido ao sem sentido, decide replantar a fazenda onde foi criado e torná-la uma pequena floresta. Logo depois desta atitude de tornar sua fazenda o paraíso em que foi criado novamente e replantá-la com espécies nativas, parte para fotografar os santuários na Terra, lugares onde o capitalismo não tocou (ainda) e que lhe lembravam o paraíso da Terra. É assim que nasceu seu último trabalho, Gênesis- onde o fotógrafo cai no gosto da burguesia.
Sou completamente pró-natureza, mas me irrita muitíssimo esta conversa de pró-natureza vinda da boca de quem apóia a exploração que o capitalismo faz do homem pelo homem e aí me dá nos nervos ver um pessoal que adora a natureza- contanto que possa continuar usando de seus recursos sem pensar na devastação que causam. Então esta unanimidade que este grande fotógrafo agora alcança me parece surreal. Tenho certeza que muita gente que hoje aplaude o sujeito pararia de aplaudir na mesma hora se juntasse os pedaços, conhecesse melhor o trabalho do homem, entendesse as motivações e percebesse que o cara é de esquerda.
Mas assim é a vida.
Acho que o filme O Sal da Terra é tudo de bom. Para fotógrafos, uma aula. Para não fotógrafos: coisas a pensar.
sábado, 4 de abril de 2015
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