Azul é mesmo a cor mais quente moçada. Todos em fotografia aprendemos que, ao contrário do que o leigo crê, a temperatura das cores que vão para o vermelho são mais frias e indo para o azul, ficam mais quentes. Para mim, o que houve de mais espantoso na minha sessão de cinema foi ver a quantidade de gente que vai embora nos primeiros dois minutos de cenas de sexo do filme- que na verdade tem sete minutos. Ou seja: o pessoal- que consegue assistir a filmes cheios de violência, cheios de sangue, cheios de catástrofes, cheios de tudo quanto é tipo de coisa assustadora e/ou escatológica- não consegue assistir a uma cena de sexo com duas atrizes belíssimas, onde as tomadas de câmara são bem enquadradas, bem focadas, tudo com perfeição.
A parte dois do meu espanto é saber que se 9 entre 10 homens têm fantasias sobre ver duas mulheres fazendo sexo entre si, 9 entre 10 homens na platéia do filme ficam visivelmente constrangidos, tanto é assim que nesta parte rola um zunzum no escurinho do cinema digno de nota.
Esta cena de sexo entre o casal- uma menina de 15 anos que se apaixona por uma artista plástica um pouco mais velha- levou dez dias para ser feita, houve reclamações por parte das atrizes porque justamente ela era repetida à exaustão e quando o filme ficou pronto, as atrizes ficaram chocadas com o resultado. Para quem não leu crítica alguma de cinema, a cena é tão bem feita que parece realmente que as atrizes estão fazendo sexo de verdade. Nenhum filme pornô com duas mulheres transando consegue ter tanto impacto e tanto realismo quanto esta cena. Os filmes pornôs sempre parecem falsos, mesmo quando se vê o pessoal jogando sêmen nas câmeras. Já esta cena, é de um realismo impressionante e a gente fica se perguntando como é que eles tinham conseguido fazer a cena.
O ruim desta cena é que ela toma o filme. Toda a polêmica em torno de Azul É A Cor Mais Quente acaba sendo mais sobre esta cena do que sobre um drama que não se restringe a casais lésbicos.
O drama central do filme é universal. E é muito bem elaborado: como a paixão é imprevisível e a gente se apaixona justamente porque não deve, e depois, a situação de abandono e rejeição sem saída onde uma pessoa sabe que será trocada por outra, independente de tudo o que ele(ela) possa fazer.
O filme é genial. Mas talvez o diretor Abdelatif Kechiche seja um Bertolucci da vida- segundo o que denunciou Maria Schneider sobre O Último Tango em Paris ela teria sido realmente estuprada por Marlon Brando ali, diante da câmera e portanto, o choro e tudo o mais, era real.
Sendo assim, vem a pergunta: até que ponto um diretor pode ir para alcançar o sucesso? Maria Schneider nunca mais conseguiu fazer nada sem ser associada a este filme. Era uma mulher muito jovem e imatura que teve uma história depois disto cheia de problemas. Bertolucci e Brando foram muito bem sucedidos. Mas e a vida daquela atriz, podia ser destruída em nome do cinema? Pergunta que se estende à fotografia e a muitas outras áreas da arte onde às vezes coisas semelhantes acontecem.
segunda-feira, 23 de dezembro de 2013
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