Há coisas que não sei fazer e nunca pensei em fazer. Abrir um champanhe fazendo a rolha pipocar longe. Andar de patins, isso sonho de vez em quando. De patins, vestida de noiva, chego num bloco de carnaval. Não bebo champanhe e gosto de carnaval assim-assim, às vezes adoro, outras acho uma chatice. Mas de patins, vestida de noiva, lá vou eu, Vieira Souto acima e abaixo, com uma grinalda drapejando ao vento.
Já fui mais feliz nos carnavais. Hoje vejo mais gente bebendo o carnaval do que brincando o carnaval. Vejo gente se pegando, muitas putas, muitos viados, muita gente se pegando. O carnaval cheira a xixi e sexo. Quem samba tirante a porta bandeiras?
Lembro do baile do América, quando um menino rodou o salão comigo. Era tudo tão lindo. Não havia este cheiro. E o menino não pegou no meu peito, nem me agarrou. Ele foi um príncipe e eu sua princesa em apenas uma volta no salão, vestida de havaiana, provavelmente.
Já fui uma moça delicada, que não falava palavrões. Já fui muitas coisas. Tal como esta cidade, toda trapos e alumínios, lixo e cheiro de gasolina. Cidade cã, eu cã. Nós, eu e a Baía da Guanabara atolada em histórias que vêm desde as bravias tribos daqui até estas outras tribos, também bravias, talvez mais, porque insanas.
O Rio pára na hora que as crianças saem dos colégios. Voluntários da Pátria, Senador Vergueiro, Avenida Nossa Senhora de Copacabana, Laranjeiras. Pára tudo. E na saída dos pais e mães das crianças de seus trabalhos. O que aconteceria se as pessoas decidissem sair dos carros e gritarem a plenos pulmões? Quem nos ouviria? São rios de carros, ônibus e caminhões. Escorrendo entre sinais vermelhos, lentamente como rios que carregam cadáveres de outros tempos.
A todo instante, alguém enlouquece no Rio de Janeiro. Alguém se dá conta da sua medonha solidão e pira. Pega fogo em si mesmo. Sem o refúgio das palavras. Pois se palavras houvesse, nunca tão grande a solidão. Quem faz uso das palavras, nunca está tão só. Tem a companhia daquele que as ouve que as compreende. O eco de outro que liga as palavras tuas, com as dele e mais outros eles, que a si se conectam num dilúvio de significados e vidas. Todos por um fio, a linha que faz as letras que compõem as palavras.
Mas há coisas que não têm palavras, apenas gemidos, gritos, ventania. Fazem-nos andar em círculos. Bater com a cabeça na parede procurando o outro lado do crânio. Para estas, só mesmo a dor.
Os velhos sobrados do Rio de nada disso sabem. Tornam-se lojas, bares, lugares para dançar ou grandes edifícios. Nossa cidade não é uma cidade difícil porque tudo segue o fluxo das praias e do mar. O Rio é uma linha entre as montanhas e águas. Quando a gente se perde aqui é porque viramos crianças, o tempo em que tudo é sempre grande demais. Essa história é enorme. E não tem um ponto final.
O moço na bicicleta sem as mãos no guidom. Isso eu também queria saber, o segredo entre o céu e as bicicletas. Os moços que devem ainda ser gentis e as meninas que com eles passeiam sonhando amores. Tudo sem ponto final.
Quem inventou o ponto final nada sabia de histórias compridas, cujo fim deveria estar sempre nas reticências... Numa noite de sexta feira, me acreditei ser minha cidade e a lágrima não veio, nem o romance. Quem dera declaração de amor. Não. Veio o Haiti, acabou aqui. E ainda sou, lá em algum canto, a noiva do Rio. Com ou sem amor, sou tua eternamente. Tuas esquinas serão as minhas memórias. E eu, como toda noiva, acreditarei que serei a mais feliz das mulheres.
Já fui mais feliz nos carnavais. Hoje vejo mais gente bebendo o carnaval do que brincando o carnaval. Vejo gente se pegando, muitas putas, muitos viados, muita gente se pegando. O carnaval cheira a xixi e sexo. Quem samba tirante a porta bandeiras?
Lembro do baile do América, quando um menino rodou o salão comigo. Era tudo tão lindo. Não havia este cheiro. E o menino não pegou no meu peito, nem me agarrou. Ele foi um príncipe e eu sua princesa em apenas uma volta no salão, vestida de havaiana, provavelmente.
Já fui uma moça delicada, que não falava palavrões. Já fui muitas coisas. Tal como esta cidade, toda trapos e alumínios, lixo e cheiro de gasolina. Cidade cã, eu cã. Nós, eu e a Baía da Guanabara atolada em histórias que vêm desde as bravias tribos daqui até estas outras tribos, também bravias, talvez mais, porque insanas.
O Rio pára na hora que as crianças saem dos colégios. Voluntários da Pátria, Senador Vergueiro, Avenida Nossa Senhora de Copacabana, Laranjeiras. Pára tudo. E na saída dos pais e mães das crianças de seus trabalhos. O que aconteceria se as pessoas decidissem sair dos carros e gritarem a plenos pulmões? Quem nos ouviria? São rios de carros, ônibus e caminhões. Escorrendo entre sinais vermelhos, lentamente como rios que carregam cadáveres de outros tempos.
A todo instante, alguém enlouquece no Rio de Janeiro. Alguém se dá conta da sua medonha solidão e pira. Pega fogo em si mesmo. Sem o refúgio das palavras. Pois se palavras houvesse, nunca tão grande a solidão. Quem faz uso das palavras, nunca está tão só. Tem a companhia daquele que as ouve que as compreende. O eco de outro que liga as palavras tuas, com as dele e mais outros eles, que a si se conectam num dilúvio de significados e vidas. Todos por um fio, a linha que faz as letras que compõem as palavras.
Mas há coisas que não têm palavras, apenas gemidos, gritos, ventania. Fazem-nos andar em círculos. Bater com a cabeça na parede procurando o outro lado do crânio. Para estas, só mesmo a dor.
Os velhos sobrados do Rio de nada disso sabem. Tornam-se lojas, bares, lugares para dançar ou grandes edifícios. Nossa cidade não é uma cidade difícil porque tudo segue o fluxo das praias e do mar. O Rio é uma linha entre as montanhas e águas. Quando a gente se perde aqui é porque viramos crianças, o tempo em que tudo é sempre grande demais. Essa história é enorme. E não tem um ponto final.
O moço na bicicleta sem as mãos no guidom. Isso eu também queria saber, o segredo entre o céu e as bicicletas. Os moços que devem ainda ser gentis e as meninas que com eles passeiam sonhando amores. Tudo sem ponto final.
Quem inventou o ponto final nada sabia de histórias compridas, cujo fim deveria estar sempre nas reticências... Numa noite de sexta feira, me acreditei ser minha cidade e a lágrima não veio, nem o romance. Quem dera declaração de amor. Não. Veio o Haiti, acabou aqui. E ainda sou, lá em algum canto, a noiva do Rio. Com ou sem amor, sou tua eternamente. Tuas esquinas serão as minhas memórias. E eu, como toda noiva, acreditarei que serei a mais feliz das mulheres.